quinta-feira, 28 de julho de 2011

O saci verdadeiro

Olívio Jekupé
O saci verdadeiro

EDUEL, 2003
48 pp.



Olívio Jekupé é brasileiro e índio, fiel às suas raízes. Engajado na causa indígena, escreve como represen-tante de uma sociedade de tradição oral, sem escrita. Pertencente ao tronco Tupi-Guarani, como se sabe um dos mais impressionantes e bem documentados do Brasil, esforça-se para ser uma ponte entre o ser-índio e o ser-brasileiro. Bebe, desta maneira, nas fontes de uma narrativa que resiste à passagem de várias gerações com cultura marcada pelo misticismo, espiritualidade e desprendimento dos bens materiais. É, também, rica na habilidade com as palavras e tem um senso poético da vida, características estas que os fizeram sobreviver aos quinhentos anos de tragédia e colonialismo.

A novidade que O saci verdadeiro nos traz é a existência de um saci indígena, descoberta do autor em contatos freqüentes com os Guarani nas várias idas às aldeias do povo de sua avó, em sua busca para resgatar a ancestralidade. É assim peculiar esta característica que só vem somar àquela já tão conhecida, fazendo com que o nosso moleque lendário seja um resultado de uma mistura afro-caipira-tupi-guarani.

Este elemento tipicamente brasileiro é fonte de estudo para alguns pesquisadores como Renato da Silva Queiroz, Luiz da Câmara Cascudo e Lydia Cabrera. Do trabalho deles construímos um personagem com espírito inventivo, malandro e coxo, que pode ser invisível ou estar em toda parte; prega peças, faz rir, é simpático e, no mais das vezes, não impõe medo. Fuma um cachimbo e usa uma carapuça vermelha na cabeça. Porém, segundo Lydia, a idéia mais divulgada é que o Saci é negro e vem da África. Já Cascudo nos diz que seu gorro vermelho e sua mão furada estão ligados ao folclore europeu, o que nos traz mais um elemento de mistura para o nosso perneta.

A obra resenhada tem duas histórias com narrativas bem simples com as características da oralidade. Os diálogos são ingênuos retratando o dia-a-dia de convivência da vida dos nativos em suas respectivas aldeias. A primeira nos conta a vida de Tupã-Mirim, um indiozinho que tem só um braço e, por isso, é discriminado em sua aldeia. Mais tarde, quando cresce e por ser obediente e amigo do Saci-Pererê, recebe dele um braço, encontra uma mulher que o ama e se impõe na comunidade.


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A segunda, que leva o nome da obra, relata a vivência de um indiozinho chamado Karaí que, todos os dias, ouve contos de sua mãe. Porém a que mais gosta é a do Saci-Pererê. O interessante é que, no decorrer da narrativa, vamos constatar que o autor nos traz aí uma dicotomia: o saci negrinho pequeno que anda com um cachimbo, assustando as pessoas, com carapuça vermelha na cabeça e um outro, o “verdadeiro”... “de quem nossos antepassados sempre falaram”, que “é bom e só aparece para pessoas muito boas e que precisam de ajuda.”

Ao final, Olívio Jekupé lança a pergunta:
“— Quem estará certo? E o Saci é um índio ou um negro? ”

Deixo-a no ar. A leitura é fácil. A ilustração é quase inexistente. Rapidinho você saberá... se você o quiser.

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